sexta-feira, 2 de outubro de 2015

Checklist para me sentir viva


  • Uma ideia na cabeça e algumas voando
  • Um livro na mão, outro na bolsa e mais um na cabeceira 
  • Um caderno em branco
  • Um caderno todo anotado e revisitado
  • Três gatinhos ronronando
  • Um cobertor de orelha não musculoso
  • Uma grama e uma vontade de me deixar
  • Uma febre de rua
  • Uma camiseta nova
  • Uma livraria e um sebo com portas abertas
  • Um piquenique rolando e os convivas displicentes sem tempo para outra coisa
  • Um banco num parque
  • Um cantinho aconchegante
  • Um cafuné inesperado
  • Um causo bem contado
  • Alguém lendo para mim
  • Uma música que faz tempo que não ouço 
  • Uma lembrança que assalta
  • Um ouvido e olhos atentos
  • Um silêncio não constrangedor e a sensação de cumplicidade
  • Um arquivo não catalogado 
  • Um café depois de uma pernada
  • Um par de meias
  • Um ato espontâneo de alguém e eu por testemunha
  • Um plano de estudo
  • Várias conversas de busão sintonizadas
  • Uma banda redescoberta
  • Um assalto de geladeira
  • Uma tesoura, uma cola, alguns papéis como vítimas 
  • Um Advil, um buscopan e uma bombinha
  • Um lugar onde ninguém esteja
  • Um lugar onde encontro quem procuro
  • A liberdade de ter todos estes itens a qualquer tempo

sábado, 26 de setembro de 2015

Autopsicologia do dedodurismo


Meu instinto de sobrevivência vem tentando dominar este assunto de todas as maneiras possíveis há muito tempo. Presencexcotidiano situações mortificantes de delação que me exasperam.  Procurei uma literatura esclarecedora, mas não há um manual de guerrilha, um compêndio de psicologia, uma notinha no Yahoo Respostas que dêem conta desta necessidade atávica de  entender para então se defender.
Sobre a fofoca, a irmã pseudo-inocente da caguetagem e da difamação, tem tratado do Gaiarsa, estudos antropológicos discutindo o seu papel  de patrulhamento social, e até um quê folclórico que faz borbulhar nosso imaginário. A delação não. Ela é sinistra e parece até um tabu acadêmico.  Talvez se for por aproximação, algo assim como entender o mecanismo de uma para se combater a outra, fosse uma alternativa viável.   Mas de alguma maneira esse subterfúgio me soa como uma tentativa de tratar uma doença terminal com florais de Bach. Há um componente de promiscuidade do delator com aquele que premia a delação que faz da alcaguetagem uma experiência terrivelmente complexa. O alcagüete se envolve com o poder buscando algum benefício pessoal, e em troca reforça e promove este mesmo poder. Na maioria das vezes aquele que detém o poder e faz uso da informação contrabandeada pelo delator é aquele que faz valer as regras do jogo no ambiente social.  Vítimas e delator são subordinados a ele e lhe prestam contas. Como então se proteger se aquele que deveria por questões éticas básicas rechaçar a delação,  faz uso dela para estreitar o seu controle social?
Como vêem eu percebi bem a dinâmica, mas ainda estou engatinhando na práxis de defesa. E para piorar, a cada novo bode expiatório imolado me sinto cada vez mais impotente e cúmplice. O ambiente se intoxica a tal ponto, os envolvidos se acovardam, se recolhem e partem para medidas desesperadas. É uma total experiência de tortura psicológica. Aí está a força do delator, ele amarra a todos pelo medo.
A primeira idéia que me ocorre é partir para a auto-martirização. Sair por aí denunciando o crime para instâncias superiores e fechando os olhos para as conseqüências. Seria fácil se o seu próprio status quo não estivesse em jogo. Bom, se você é reles pecinha do sistema é bem arriscado.
Outro modus operandi que me parece possível é aquele da falsa indiferença. A gente se aliena à situação na medida do possível e fica em alerta todo tempo com esquemas de segurança operantes para não ter surpresas. Uma reação muito humana, mas também muito egoísta. A cumplicidade com o delito ainda está latente e a injustiça continua a comer solta apesar de você e da sua fortaleza.
Há quem diga para usar a mesma arma do inimigo e partir para a delação desenfreada, revertendo o jogo e transformando o delator em detratado. Convenhamos, estamos tratando aqui da falta de ética, em que pessoas se apóiam na máxima que os fins justificam os meios... Há que se vender a própria alma?
Um último recurso: isolar o delator. Exige uma organização coletiva considerável e atacaria a questão primordial da rede de informações-poder.  Daí penso com meus botões Se é possível isolá-lo como se faz com um virus.
Me sobra mais um lamento: não ter aprendido a jogar xadrez...