sexta-feira, 1 de maio de 2009

Sou pedestre, e daí?


Todo mundo nasce pedestre mas se esquece disso quando vira motorista. Talvez seja por isso que exista tanta prepotência dos motoristas com os pedestres quando disputam espaço na pista. Eles sempre acham que são "preferenciais" e esperam impacientes os pedestres atravessando na faixa. Há quem acelere os motores para o pedestre acelerar os passos. Há aqueles que sempre param em cima da faixa. Salvo uns e outros que gentilmente acenam para nós pedestres atravessarmos ou que dão seta para entrar e não nos deixam naquele vai-não-vai antes de por os pés fora da calçada.
Sou pedestre com muito orgulho e meu mundo é a calçada. Vou persistindo nesta condição enquanto moro perto do serviço e tenho facilidades de transporte com ônibus e metrô nos arredores do meu mocó.
Não pensem que é fácil. Como sou a única da minha família a não pertencer à espécie dos motoristas e tenho muitos amigos motorizados, sofro certa pressão: "quando é que você vai comprar um carro?" ou "você ainda não tirou carta!". Para despistar cheguei a fazer algumas promessas públicas do tipo "vou tirar carteira este ano". Claro que não cumpri. É uma questão de honra não cumprir e desapontar todo mundo.
Nem sempre fui tão convicta. Quando era criança tinha minha calói e vivia muito feliz com ela. Poderia ter me tornado ciclista e garantir uma saúde extra. Só que depois de grande peguei uma insegurança de pedalar entre carros. Constatei isso quando fui visitar minha irmã na praia e resolvi dar um passeio de bicicleta com meu sobrinho na garupa. Tremia em cima da bicicleta como se fosse uma iniciante.
Com carro também já aconteceram algumas tentativas de aprender. Um namorado da adolescência chegou a me ensinar umas coisinhas. Acho que me deixei ensinar só para agradá-lo. Minhas irmãs um dia me colocaram no volante numa praia vazia e se divertiram com minhas barberagens na areia. Outra vez  em Carmo de Rio Claro assustei uns mineiros que estavam numa praça quando adentrei o gramado com um possante fusca. São estas as únicas lembranças que tenho ao volante.
Recentemente alimentei um desejo de ser motoqueira. Comprei uma Vespa linda, preta, com visor parecendo aquele seriado "Chips". Me imaginava saindo por aí pilotando pelo mundo bem "easy rider" com a musiquinha "born to be wild" na cabeça. Pura maluquice imaginativa! Fui procurar como aprender e me desanimei. Teria que aprender a pilotar uma moto convencional, tirar a carta e daí finalmente aprender a pilotar a vespa. E a bichinha é possante, não é nenhuma mobilete. Minha imaginação começou a produzir imagens mais sombrias, eu estatelada no chão com ossinhos quebrados. Não, não, não. Prefiro meu ponto de equilíbrio bem fincado nos meus pezinhos calejados. E a Vespa, que fim levou? Está lá na garagem ocupando espaço.
Por fim, para demonstrar minha total inaptidão com o universo automobilístico confesso aqui a minha incapacidade de reconhecer carros. Vendo um carro desses modernos não sei dizer de que marca é. Se um dia precisarem de mim como testemunha de acidente só saberei dizer "era um carro de tal cor...". Só reconheço carros das décadas de 80/90: gol, galaxy, fusca, belina, brasília, maverick...
Acho então que meu caso é simples assim. Não tenho medo de volante, não tenho disposição para aprender, não tenho entusiasmo. Todo o meu DNA de pedestre pulsa dentro de mim me impedindo de cooptar com este mundo dominado pelas quatro rodas. E pensando bem, a cidade não precisa de mim como mais uma motorista a atormentar neste trânsito caótico.